Quarta-feira, 21 de Julho de 2010
Tarde chego a todo o sistema,
àquela mancha cinza, ocre e
sanguínea, que nos tira o saber
metálico, que respira por nós
num túnel de sonhos pensativo,
em forma de magnético reduzido.
Mesmo assim voltado ao vento,
prenúncios do passado distinto
me dizem mãos no pensamento
de imagens no cais do lamento,
onde a vida corre ao milímetro...
Quarta-feira, 24 de Março de 2010
Elegia
para meu irmão António
Ele bem quisera afastar o frio
das florestas pequenas do Mundo,
com falas assimétricas, onde o vento
se aconchega por momentos
vividos entre madeiras de quebrança;
Densas flores geladas à hora certa,
queimadas de sussurros e milagres
de ventos impetuosos, num silêncio
sagrado entre nós os desesperados,
num suave sono esquecido de Março.
Porque hei-de chorar enquanto
no mar alto se esvai tudo na terra...
e tudo se perde em lágrimas ao mar?
Segunda-feira, 1 de Março de 2010
Quem sobe o rio Douro
o fenómeno de memórias
de palavras poéticas escritas
dos orfeus do passado,
admira o que foi admirado
numa clara geografia
de momentos da Galafura
ao miradouro de S.Brás;
Fixa tudo o que a natureza
dá, rigidez das escarpas
de montanha acima
envolvida em mulheres
formigas que se espigam
no mar das vindimas...
Da torridez estival do clima,
à tormenta da chuva
entre ravinas do eterno rio
da Valeira, flutuam
os últimos raios de sol;
a uva torna-se mais digna
na mágica transformação
do néctar à forma divina.
Terça-feira, 26 de Janeiro de 2010
®manuelvarella
Ó Camões que iludiste a farsa
Ó Sebastião o desaparecido d'África
outros lutaram, outros ficaram à rasca
e dar lugar ao núcleo de pé
jovem messiânico sentado em paz
Sebastião d'Ourique mito de Portugal
deu razão a Camões e Pessoa o Quinto Império
Ó águas turvas do Tejo poeta
Ó lugares das ninfas cantadeiras
nelas de trajares e deles a suarem o leito
e a elas suplicaram de outro jeito
Ó trovas e amores que da Tágide liberta
Terça-feira, 12 de Janeiro de 2010
EL TIEMPO
Abrazo a la espiga del tiempo,
mi cabeza es una torre de fuego.
¿Qué es esta sangre que palpita en la arena
y qué es este ocaso?
Llama del presente, ¿qué vamos a decir?
[...]
Abrazo la época que viene y camino,
rebelde, con andares de capitán,
trazando mi país.
Subid a sus más altas cimas,
descended a sus profundidades.
No encontraréis miedo ni cadenas.
Es como si el pájaro fuera rama,
la tierra un niño y los mitos mujeres
¿o tal vez sueños?
excerto de um longo poema
de Adonis
(Ali Ahmad Said)
tradução do árabe de
Maria Luísa Prieto
Segunda-feira, 11 de Janeiro de 2010
sem milagres
a frequência da luz
vem atrás da sombra,
a frieza primaveril
do tempo de Jesus,
fria e quente seduz
a esperança do acerto
das estações ao tempo;
milénios de história
entre constelações
de almas perturbadas
onde os cometas nascem
e voltam a morrer na cruz
fotográfica e longe
da saudade que os reduz
a ícones de insónia;
cores da Babilónia
onde a linguagem emerge
cadenciada de sons
marítimos e odores
carisma de Babel onde
repousam as primeiras águas
do Tigre e Eufrates.
Quinta-feira, 24 de Dezembro de 2009
2009
Ai, se o ai fosse meu
me falasse sempre
deste mundo nada visto,
esse dois ais constantes
voltados à raiva distante
de sóis e rios onde passam,
livres de correntes, o eco
persistente de sons,
que não se escutam longe;
Esses outros caídos,
que recuam do espaço
a compasso das mãos
no teclado em vozes sol.
Ai, se o ai o não fosse
em vozes do passado,
mas o numérico teclado
do cismo eléctrico
do Natal e o presépio.
Terça-feira, 24 de Novembro de 2009
® Dizia ele para tudo: 'os alemães o QUÊ....?'
Sexta-feira, 20 de Novembro de 2009
voltei à montanha onde a luz
está perto das nuvens, e parecem
flores brancas fruídas de maldição,
que as rezas e caminhadas longe
é saber o contexto da palavra;
como sinal do sol é reflectir a alma
perco o sabor da paixão no tempo,
e esculpir o crepúsculo do vento...
Sexta-feira, 13 de Novembro de 2009
vou pegar a minha indignação
ao contrário do vento que me faz
agreste e falador de outro mundo
de formas a cores e tiragens de jornais
processadores agora e jamais...
corre nesta fórmula o desejo de crer
entre mares e costumes e encontrar
as mansas feituras do segundo
velocidade que não dirige a verdade
e suportar os discursos imundos...
Quarta-feira, 11 de Novembro de 2009
o meu interior são pântanos
derreados sobre a loucura
com latas e buracos na sucata
pinturas de merdas sem esmalte
num desejo a voltar ao exterior
numa vida de azul tremeluzida
de música cruzada no ventre
e na voz da estrada dorida;
na respiração das levitações
esquecidas em quedas do infinito
indecisão mental das realidades
e clausura dos anos sessenta.
Quarta-feira, 4 de Novembro de 2009
12 de Julho de 1967
Minhas mãos te escrevem no corpo,
palavras que me doem no meu;
caminham sempre em escrita cerrada,
e no significado de cada letra diluída,
resta o meu pensamento cansado.
Redonda forma em mar sereno
segreda-me uma só palavra tua,
e repousa na onda a mensagem,
seio de escrita ao sabor da Lua.
coimbra 1967
Domingo, 1 de Novembro de 2009
tanta coisa que não se conhece
havendo tudo que nada que se precisa;
salve-se quem sempre aparece
sabendo tudo que nada interessa
na hora, no tempo, na ideia concisa...
pourquoi un progrè?
et pourquoi une gêne?
MLV.2008
HOMENAGEM AO POETA
da
'Távola Redonda'
Fernando de Paços
[...]Caminhos, onde
O sol já quasi frio,
Quasi confunde
O meu tremer
De desespero
E a minha sede de ter
O que ainda espero...
Dias perdidos...Dias que hão de vir...
Enquanto o mar nos adormece os sentimentos
Para os sonhos do nosso entardecer...
Fenando de Paços
-1923-2003
excerto do poema
CREPÚSCULO
Segunda-feira, 19 de Outubro de 2009
outra vez o dr. saramago aparece a bufar ostras do conhecimento
bíblico, quando não é coisa nenhuma escrever um livro sobre CAIM
[e por que não ABEL?] senão para arranjar um pretexto de publicidade
de borla, ufffff. de borla e com desejos de voltar a um novo escândalo
como '...segundo Jesus Cristo' consagrar o que já foi dito ca'té serviu
para receber o prémio nobel...ai, zajus, zajus, zajus...
ler 'bíblias' não chega; deve entender-se o que está escrito..., como,
onde, e para quê. concerteza não será para copiar à balda, não?
Segunda-feira, 11 de Maio de 2009
álea nocturna brilhante húmida
riscos de chuva e fogo d'artificio,
sei lá quê de inocência a recordar,
aqueles carris de ferro a gemer
a gemer carruagens se cruzam;
ora do norte ora do sul e batem
vidros, ventos dizem palavras
não mais recordar o estremecer
a desesperar momentos longos
não fosse tudo o mais esquecer
sensações a dormir e logo acordar
meu começo esse fixo querer
do passado temer o presente e dar
quem me fica nos braços longe...
Terça-feira, 13 de Maio de 2008
depois vem a transparência
da vontade, a memória_____
e a resplandecência da cena
enquanto aves negras escusam
perder tempo nos tempos ____
rodeando o espaço, cantando
a vitória de amores devassos
passam as épocas, outros hão
dividir as searas como sempre
sem limites transparentes____
de matéria dividida a doentes
crentes do sinal e da semente
que hão-de também ser gente.
Quinta-feira, 25 de Outubro de 2007
Se ouro fosse uma flor
Teria um jardim dourado
De águas correntes e sons
Por todo o lado, brilhantes
Poços de minas frescas
De alabastros florescentes
Como que enrolada em espuma
Do tempo onde divago;
Desejo não ter desejos
E olhar estrelas azuis
Melodias inaudíveis
Escritas no feminino, sol
Maior de voz rosada
Em cada face pálida, onde
A mão em forma de noz
Sombreia nevoeiros cinzentos
Outro quinteto de matéria
No areal da praia a Loura
Esmeralda verde-mar limão
Cantares do arco-íris pintado
Ó flores de indecifráveis cores,
Então o mundo está oco...
Graças dos olhos que vejo
Se nem tudo que anda é ouro.
Domingo, 14 de Outubro de 2007
____andei pelo volume da atmosfera;
_______que a devoção seja mistério
nos apertões em conflitos________
e cada um_______ sabe da sua arte
porque ser peregrino é algo de sério.
os valores do espírito estão no tinto
na forma__inteligente____esquecer
com mil ciclos no ouvido__________
a ferver no cérebro_____descontente
em forma de gente.
ah,____________lúcido para sempre
______num mar de florais e anémonas
onde a decisão se pratica __________
crepúsculo__________ insónia e tempo
__________ no cantar a solidão da gente.
: Confutatis, do Requiam de Mozart
Sábado, 13 de Outubro de 2007
quem te diz que esta flor não és tu,
que eu sei onde te encontro sem desejo
naquele jardim de fonte d’água limpa,
de medo nocturno e reflexa chuva
caída no terminus d’alba loucura;
na volta deixaste cair com doçura
o manto de seda púrpura no lago
onde navega a saudade em água turva,
sem ventos nem rumores esquecidos
de calúnias mal queridas a pensar...
logo te ergues num salto felino seco,
rodopiando nas portas daquele reino
onde amar é uma forma de pesca,
seja em águas turvas seja no mar
distante embarcação do navegante.
árvore onde colhes a luz e as estrelas
num brilho escusado de quem sabe voar,
limite de sons e falas etéreas, esse espaço
dum olhar minucioso perante o céu
de provérbios e luzes, sinais fulgurantes.
Domingo, 30 de Setembro de 2007
Andam passos da noite projectados
numa sombra de metáforas ao luar, luz
de mar e prata em brilhantes espumas,
equinócio a mar como chuva de Março.
Que risos que ouvidos num eco cerrado
em formas de ondas luminares de Sol
sob profundas escadas do oceano
entre penedos naif e lobos marinhos.
Estádios floridos e maravilhados com
rosas murchas da velha cabeça nua
numa desgraça que não caminha só
arrepiada na assuada que os leva à rua
Onde a morte não chega a viver assim
quase esquecida em fumos e desesperos
numa tarde na praia deitada em tal sorte...
Sexta-feira, 28 de Setembro de 2007
Penso numa janela aberta
Onde o mundo não existe
Penso no tempo que passei a ter
Cuidados comigo; com a palavra
Ser para não parecer com outros
Que de imediato recuso. Descanso
Quando penso que o mal não sou eu
Penso no tempo do Liceu, o que
Aprendi o que sei e me esqueceu
Nas marcas que deixam ficar
E não parecer, nem o lutar de ser
Os impulsos de fazer, diferente
E avançar em percurso, lento
Demais para as ideias feitas...
Quase perfeitas se igualdade fosse
Igual, a partilhas terrosas da floresta
Sem limites de territórios solitários
Terça-feira, 28 de Agosto de 2007
...se na alma da vida
a cor do mundo predomina
o amor renasce enternecido
numa dimensão gémea
de comunicar a despedida
assim a dor se torna
em ferida calma e não
em forma doentia
ou aviso trespassado;
aquele corpo equilibrado
aquele sorriso de brilhos,
olhos tristes de saudade,
a fusão de corpos unidos
a nudez de silêncios
e afectos bem-queridos
Quarta-feira, 18 de Julho de 2007
a vírgula
saltério a saltar meio aéreo
que salte claro e a sério
antes de chegar a noite
já o dia me acordou
penso uma pessoa não poeta
nem asceta meio pateta
ah, tanto nome tanta ginja
deixo a porta aberta
para que não finja
uma amizade apardalada
vai poeta do quarto dez
buscar outro nome
escreve poema se poeta és
Quinta-feira, 7 de Junho de 2007
água da vida do sal e do baptismo
no primeiro impacto como exorcismo
na idade do nada mas de tudo que fica
para sempre marcado como sistema
da primeira atenção da natureza;
num instante senti-me rodeado
numa onda quebrada com firmeza
subindo pelo meu corpo deslocado
de protecções, antes aconchegado
na certeza que não seria engolido...
o mar de Neptuno e da Antárctida
qual celebrado contacto do fundo
elevou-me ao resultado da equação
que descobre o mundo na verdade
de uma protecção tão desejada como
recebida de uma luz num segundo.
Domingo, 3 de Junho de 2007
outra vez a ver o mar
há certos encontros na vida
que são difíceis de relatar
com verdade fundamental
de factos encontros e mais
coincidências, o déjà ver,
sensação e pesada existência
no desmanchar da feira
a primeira angústia reconhece
pessoas num ser descontínuo,
tendo para mim’alma gémea
em escrutínio, se não a mereço
serei cúmplice de mim mesmo
a novidade requer memória
genealogia e ordenação cronológica;
amar sonhador e platónico lugar
ao tempo da vida de nunca ser
nas vezes que fui a ver o mar...
Sábado, 19 de Maio de 2007
pensar
para Te escrever um poema
Senhor, é preciso lutar
na palavra de luz constante
para que a rima desapareça
e reapareça a crença da frase
as formas levadas ao lugar
do instante, à humildade
-presença das águas límpidas
tão naturais de origem
como os erros da morte...
Sábado, 12 de Maio de 2007
Livraria Clássica
não sei de mim nem da geração
que alimentou a curiosidade
de muita palavra, as promessas
o costume de quem gosta
de cobaias, as dormidas no chão
a “múmia” do colchão, as donas
do quarto, a limpeza das estantes
os profetas vizinhos de baixo
agourando a queda do piso
das estantes e o peso dos livros;
todo o ano se esperava
por uma sopa, ou melhor
pela feira do livro, pelos amigos
pelas voltas em sentido único
desapercebido, nas raridades
nos empurrões ao desbarato
os poetas, os artistas e os chatos
de revista debaixo do sovaco,
despenteados com o vento
poeirento da avenida da liberdade.
entravam os panascos do parque
às batatas fritas e ao cabrão
do bife no Aviz ou Ribadouro;
e de que gritos suplicava correndo
bufando atrás das gajas o artista,
mítico pintor da nossa praça
impecável vestido e penteável
sereno ao despejar o saco, buff...
buff, dizia irritado do cheiro a putas.
de resto ao fim do dia ainda se comia
as tapas em pão de centeio, old rarity
quando não se bebia um tinto chambrér
e deixar que os galegos bocejassem
e subir avenida conversando a romper
quase na aurora o desgaste e o cansaço.
Terça-feira, 8 de Maio de 2007
com significado da verdade
decorre o conceito da retórica,
a sede sensual, o copo d'água
que emerge da mão, ritual
numa outra palavra, ginástica
mental para não dizer nada
coexistida na forma, a diagonal
frase que se desfaz, acentuada
vem o clic da máquina digital
momento da foto entra em parto
sem consentimento, e rápido
ou está tudo mal e logo se nota
a foto do arraial e casamento
Segunda-feira, 7 de Maio de 2007
“[...] Los pintores modernos en sus blancos estúdios
cortan la flor aséptica de raiz cuadrada.
En las aguas del Sena um iceberg de marmói
enfría las ventanas y disipa las yedras [...]”
Federico Garcia Lorca
os pintores modernos
nos seus brancos ateliês
cortam a flor asséptica
de raiz quadrada...
deixo que as maravilhas de Tarso
cheguem a mim num deserto
de emoções e desesperos
de tabuada mal estudada
produzo tempos e imagens
que se esquecem de viver
nos paraísos esotéricos
de arquivos mal dormidos;
deles emigram as aves
em quilómetros de acetato
micro micróbios pensados
frame a frame destruídos;
libertos saem ilustrados,
depois nascem verdades
em muro circundado
d’águas de um icebergue
esfria as narinas
e dissipa as heras.
Sexta-feira, 13 de Abril de 2007
1. o mundo está frágil
enganador impertinente
sem nunca deixar
de querer o domínio
e o extermínio
do que deu para tirar
impiedoso, cirúrgico
sem dor aparente
2. e vão desaparecendo
a árvore o amor
pela luz e pela flor
que premeia o estar
na vida vegetal
vegetando impotente
num parto natural...
3. de quem pensa na vida
para outro tempo
mental que esquece
o presente o sempre
o igual sem dar
em troca o lugar
onde nascemos
4. e poucas são
as hipóteses de vencer
sem esperar que a morte
desenrole a troca pelo
absoluto, a verdade;
5. interrogativo silencioso
pela ansiedade
reservada ao dia seguinte
num mar tumultuoso e salgado,
bilhete há muito perdido,
onde o sonho se desencontra
no limite da nosso identidade...
Quarta-feira, 4 de Abril de 2007
...depois foi a Casa em ruína
a doutrina vulgar do mundo,
foi silêncio a cada esquina;
apenas desconsolo, e neblina
no meridiano errado, o destino
de que névoa mais congela,
a torrente do conhecimento
entorpecido nas multidões,
embora numa forma singela
mais bela que o sol, ó Sol
e ninguém deixa de querer
conjugar o verbo renunciar,
privação e paz no lugar certo,
o Vento a baloiçar sem ver
a paz que faz no deserto...
Sábado, 31 de Março de 2007
“Para Oeste vagueia o olhar:
para Leste navega o barco.”
da ópera Tristão e Isolda, de R.Wagner
para oeste vagueia o olhar:
para leste navega o barco.
o raio de luz atravessa a ilusão
da onda que se desfaz líquida
na alma que passa, migração
predominante de melodia
de efemeridade fantástica
e o tempo de escassa novidade
acolhe a meditação do navegar
deixando para o marinheiro
os prazeres humanos do mar...
para oeste vagueia o olhar:
para leste navega o barco.
Quarta-feira, 21 de Março de 2007
chego à minha etapa
do verso concreto
de espaço branco
estendal secreto
amor-gosto, sol-posto
caminho à sorte, o ocaso;
ousado pensamento
de lento transporte
entre montes e vales
sem perturbar o universo.
Quinta-feira, 8 de Março de 2007
cópia opulenta
de riqueza fresca
com desejo, soa
nos bosques
de cimento
voltados
a quatro ventos
num tempo
presente;
lançado
com firmeza
na marca de palavra
deixando para trás
o que se atrasa,
ritos da cidadela
ecoam momentos
de amor e tristeza
leituras
ao crepúsculo
e regras
entre choques
de luz e farpas
sombras e clarões
se apagam;
ó, reino da incerteza...
Sexta-feira, 16 de Fevereiro de 2007
houve tempos em que
a noite se calava
adormecida no silêncio
antes da madrugada
e dos ruídos do nada;
as horas não se ouviam
nem o sonho falava
ínfimo resto onde
cintilavam astros
no mesmo silêncio
em forma de universo
e nunca mais a vi
e nunca mais a esqueço...
Quinta-feira, 8 de Fevereiro de 2007
repasto nocturno
foi numa tarde assim
lenta, morosa de vento
selvagem que o Inverno
estendeu num arrepio,
memória do tempo
que nos dá novas
antigas, que não mais
se reproduzem
em conversas à lareira,
esquecimento
da realidade passada,
incertezas do verbo ser...
depois a refeição
sobre o ardor do lume,
a mitigar contemplação
do belo rosto
e do repasto
do meu sentido,
das coisas e da vida;
encruzilhada de enganos
em cascatas e rios
a escoarem-se..., vazios.
Sexta-feira, 2 de Fevereiro de 2007
memória a nevar
cheguei na hora
de te ver
neve
ao de leve, a cair
em Alfragide...
o tempo agora
está assim;
a tudo se atreve.
incerto, vencedor
mas até breve.
Segunda-feira, 2 de Outubro de 2006
3 acidentes plásticos
uma curva de cores
num fingir de formas
encapotadas no delírio
do traço ou do melhor risco
das telas de vidro batido
pelo sopro iluminado
luz que trespassa o aroma
caminhos de passagem
num zelar de vida natural
entre luzes perceptíveis
em lugares de miragem
mulheres de xaile mudam
nas praias o sentido do vento,
vendas de camarinhas e pevides
sobre arcas luminosas da feira
e odores de azeite frito
outra forma do desejo
o bulir da pedra, o seixo
das almas do neolítico
alheados da própria sombra
cabanas de xisto luzem
velhos afectos cruzam,
amantes esquecidos
na proa de um barco
a navegar pela nostalgia
dos moinhos desvelados e
fluidos em frigidas neblinas
da pintura de Turner.
Terça-feira, 19 de Setembro de 2006
antepalavra
senhora do mar
ao naufragar
lado a lado,
logo a vi
numa alga
a flutuar
de mão dada
na tua
como se o tempo
fosse cortina
d'olhares e amares
em surdinas
tempestades
ah, se eu soubesse
do pesadelo
acordado
ouvindo passos
de inquietude
solitária
contigo a pensar
perdido
de não te sentir
a meu lado assim
diluída na sombra
do sol nascente
naquele profundo mar,
lado a lado
agarrados de bocas
coladas sem emergir...
Sábado, 29 de Julho de 2006
as abelhas dançam
em cada flor
e fazem amor
em cada ramo
sem horas para
dormir
sem vida
para comer
dançam, dançam
à volta da flor
e não se cansam
de tanto fazer amor
mel e cera
quem diria
é da abelha
o parto sem dor
porque amor
a toda a hora
cansa
mesmo que seja
no ramo da flor.
Sexta-feira, 21 de Julho de 2006
10 horas
Tanto livro
tanta palavra
tanta sabedoria
um dicionário
para nada
16 horas
Tanto livro
tanta areia
tanta sede
e um dicionário
construí um abrigo
tudo queimado
fiquei sem nada
Quinta-feira, 13 de Julho de 2006
o meu interior
são pântanos
derreados
sobre a loucura
de latas
de sucata
e pinturas
de esmalte
nas imagens
desejo:
voltar a existir
na pintura
modernista
renascendo
à escala de génio
anímico
que não eu
decisão intacta
de um retrato
de amadeo...
Terça-feira, 13 de Dezembro de 2005
Li, a seu tempo, o romance "Os Cus de Judas" de António Lobo Antunes, nos anos 70. Confesso que na primeira leitura, agora chamada na diagonal, pareceu-me uma prosa desarrumada, desconceituada no aspecto "gráfico-sintáctico". Mas, li alguns capítulos. E voltei atrás para recomeçar numa leitura mais disponível, com mais, digamos, paciência e atento à nova linguagem da sua escrita -porque reflecti sobre a razão estilística do assim "ser". Digo, por outro lado, que renasci do bloqueio das duas décadas precedentes, após a leitura dos romances seguintes de Lobo Antunes. Fez-me sentir noutro mundo narrativo, um pouco semelhante à técnica do romance policial, mas de tal maneira eficaz que, concluí ser a sua prosa pós-neorealista, elaborada para se efectuar uma leitura bem mais rápida, cinética, algumas vezes poética, autobiográfica e contraditória de uma sociedade onde a loucura, se encontra fora das grades dos hospícios. O percurso da minha geração -e do escritor-, encontra-se retratado na sua obra literária, desde a "Memória de Elefante", que obviamente veio incomodar muita gente. António Lobo Antunes foi candidato, várias vezes, ao Prémio Nobel, por mérito do seu perfil de escritor que não é apenas "local"; lê-se em qualquer língua, fazendo-se compreender numa comunicação universal, que se chama, sinceridade e actualidade. Que mais é preciso?
Sábado, 12 de Novembro de 2005
José Saramago parece gostar de janelas. Há diversas posições de pose, pedidas ou estudadas à janela, normalmente fechada protegendo o que se julga ser a melhor posição de fotogenia. A última que lhe conheço não sendo parecida é igual: ar circunspecto de profundo olhar para além do espaço que transcende o seu universo. Ou, talvez, como que uma reclusão intelectual por detrás da janela de aros de madeira mal pintados, olhando entre vidros o profundo não ser do seu mundo exterior, que o não protege dos seus conflitos existenciais, pois "o universo não tem notícia" da sua existência porque, os que o vêem passar na rua não dirão, "vai ali um materialista", antes, um prémio Nobel, "uma pessoa que tem as suas ideias as suas opiniões, os seus sustos, as suas esperanças"...Quais?-aquelas do Fernando "Pessoa sair do Cemitério dos Prazeres e passear por Lisboa com Ricardo Reis" -achado brilhante [na minha ideia conceptual das coisas em movimento] no seu romance, O Ano da Morte de Ricardo Reis? Talvez não: seria aproximar-se de uma ideia de reencarnação futurista de um qualquer beato da igreja católica. No fundo, o seu conflito não é com Deus mas sim com a Igreja Cristã, tanto mal concebido como entendido, no seu "Evangelho" temático para júris ver, o polemizado conteúdo intertextual de, O Evangelho segundo Jesus Cristo. O tema da morte é uma tentação, uma desilusão, uma frustração para quem não pediu para nascer. Não sei se o universo filosófico de Saramago tem alguma explicação genética, espontânea darwiana, religiosa/marxista, nietzschiana, para o "fenómeno" do percurso do nascer até à morte; de Nietzsche, disse Zaratustra, "como todos os elucidados do além" dizia que o mundo parecia-lhe "um sonho, um poema inventado por Deus. Uma nuvem irisada abrindo-se diante dos olhos de um divino descontente". Em que ficamos; Deus, Darwin, Nietzsche ou Saramago?
Sexta-feira, 11 de Novembro de 2005
Eu estou aqui!...AQUI...i...i...